COMENTÁRIOS À INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 43/2020 DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA SOBRE MULTAS EM LICITAÇÕES E CONTRATOS
Aldem Johnston Barbosa Araújo
Advogado em Mello Pimentel Advocacia;
Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE;
Autor do livro "Processo Administrativo e o Novo CPC - Impactos da Aplicação Supletiva e Subsidiária" publicado pela Editora Juruá;
Articulista em sites, revistas jurídicas e periódicos nacionais;
Especialista em Direito Público.
(e-mail: aldem.johnston@mellopimentel.com.br)
Comentário do articulista
Foi publicada em 09/06/2020, na edição nº 109 do D.O.U, a Instrução Normativa nº 43/2020 da Secretaria de Gestão da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, que permite dispensa, parcelamento, compensação e suspensão da cobrança de multas aplicadas em licitações e contratos da Administração Pública Federal realizadas pelo regime das Leis nº 8.666/1993, nº 10.520/2002 e nº 12.462/2011.
Inicialmente chama atenção a ausência de menção na norma das multas aplicadas em licitações e contratos da Administração Pública Federal em sede de concessões e parcerias público privadas. Mas, neste particular, como nem a Lei nº 8.987/1995 e nem a Lei nº 11.079/2004 trazem um tratamento exaustivo sobre a aplicação de multas, a aplicação subsidiária da Lei nº 8.666/93 permitida pelo artigo 18 da Lei de Concessões e pelo parágrafo 1º do art. 3º da Lei de PPPs, abre-se certamente a possibilidade de aplicação da Instrução Normativa nº 43/2020 também às concessões, sejam as comuns sejam as celebradas no regime das PPPs.
Expressa disposição da instrução normativa estabelece que seus dispositivos podem (facultativamente) ser aplicados por Estados e Municípios relativamente a contratos em que que se utilizem recursos da União decorrentes de transferências voluntárias e, no que couber, pelas Forças Armadas.
Para ampliar o espectro dessas normas contidas na IN sobre dispensa, parcelamento, compensação e suspensão da cobrança de multas aplicadas em licitações e contratos o ideal é que Estados e Municípios editem normas símiles, vez que, sendo a norma só aplicável a entidades que tenham utilizado recursos da União, é interessante e importante ampliar o leque de beneficiários.
A norma infralegal dispensa a formalização em processo, o registro contábil e a cobrança administrativa de multas aplicadas em licitações e contratos cujo valor total aplicado ao mesmo devedor, sem juros ou atualizações, não seja superior ao valor atual de R$ 1.000,00 (mil reais).
O valor é extraído do inciso I do art. 1º da Portaria nº 75, de 22 de março de 2012, do Ministério da Fazenda, que dispõe sobre a inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e o ajuizamento de execuções fiscais pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
As Leis nº 8.666/1993, nº 10.520/2002 e nº 12.462/2011 não definem os valores das multas, remetendo tal questão ao instrumento convocatório e ao contrato. Como editais e contratos normalmente atrelam os valores das multas a percentuais que incidem sobre o valor da contratação, o universo de beneficiários pela dispensa do pagamento, em razão do teto de R$ 1.000,00 (mil reais), restará adstrito às contratações de baixo valor.
A instrução normativa permite que o débito resultante das multas aplicadas com base nas Leis nos 8.666/1993, 10.520/2002 e 12.462/2011 seja parcelado, total ou parcialmente, em até 12 (doze) parcelas mensais e sucessivas (a Administração poderá decidir pelo parcelamento do débito em número menor de parcelas pretendidas pelo interessado), mediante requerimento formal do interessado à Administração (que, se deferido, constituirá confissão de dívida e deverá ser acompanhado do comprovante de que o devedor recolheu à Administração a quantia correspondente ao valor do débito que pretende parcelar dividido pelo número de prestações).
Ainda quanto ao parcelamento das multas, a Instrução Normativa nº 43/2020 exige ainda que, no caso de os débitos se encontrarem sob discussão administrativa ou judicial, submetidos ou não à causa legal de suspensão de exigibilidade, o sujeito passivo comprove que desistiu expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou do recurso interposto, ou da ação judicial, e, cumulativamente, renunciou a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem a ação judicial e o recurso administrativo.
A norma preconiza que a falta de pagamento de 3 (três) prestações (consecutivas ou não) enseja o cancelamento automático do parcelamento concedido, bem como a imediata exigibilidade do débito não quitado, sendo vedado o reparcelamento de débito referente a parcelamento em curso ou que não tenha sido cumprido pelo devedor.
Tal cancelamento automático não nos parece uma medida consentânea aos valores constitucionais que resguardam o contraditório e a ampla defesa, devendo ser concedido um prazo, mesmo que sumário, para que o interessado eventualmente apresente justificativas para a inadimplência.
Já sobre a compensação das multas aplicadas em licitações e contratos, a IN do Ministério da Economia permite que ela se dê de forma total ou parcial e exige que ela tenha por objeto créditos devidos pela Administração decorrentes do mesmo contrato ou de outros contratos administrativos que o interessado possua com o mesmo órgão ou entidade sancionadora.
A compensação, que pode se dar a pedido do interessado ou decorrer de atuação ex officio da própria Administração, poderá se realizar de forma parcelada, observando os prazos de vigência de cada contrato administrativo indicado no requerimento, não podendo ultrapassar o prazo de vigência originário do contrato. A norma ainda assinala que as retenções para adimplemento das obrigações de natureza trabalhista e previdenciária dos contratos de serviços com regime de dedicação exclusiva de mão de obra têm prioridade em relação a pedidos de compensação.
Aqui, cumpre destacar que, se no caso de compensação a pedido do interessado será instaurado um procedimento para a devida apreciação, apuração e decisão, quando da compensação ex officio por parte da Administração também se deve instaurar um procedimento, garantindo-se a oitiva do infrator que restou multado para que ele possa exercer o controle sobre a operação.
Por seu turno, acerca da suspensão da cobrança dos valores decorrentes das multas aplicadas em licitações e contratos, a Instrução Normativa nº 43/2020 permite que a Administração (sempre tendo por motivação os impactos econômicos advindos da emergência de saúde pública, nos termos da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020) a empreenda (mediante requerimento formal do interessado que deverá ser decidido em até 30 dias) por um prazo de até 60 (sessenta) dias após o dia 31/12/2020 (que corresponde ao término do estado de calamidade pública de que trata o Decreto Legislativo nº 06/2020).
A exigência da norma do Ministério da Economia de que a motivação da suspensão de cobrança da multa seja atrelada aos impactos econômicos advindos da emergência de saúde pública provocada pelo coronavírus deve ser entendida de forma ampla no sentido de permitir que ela seja aplicável a qualquer tipo de multas aplicadas em licitações e contratos e não apenas àquelas decorrentes diretamente de licitações e contratos com base na Lei nº 13.979/2020, uma vez que uma leitura apressada e equivocada do dispositivo poderia levar a uma conclusão diversa.
Por fim, é preciso louvar a iniciativa de edição da Instrução Normativa nº 43/2020, vez que, diante dos inúmeros desafios que se impõem a gestores e administrados por força da pandemia do coronavírus, normas como essa permitem uma bem-vinda flexibilização nas relações contratuais, que inclusive pode garantir não só a própria execução dos contratos, como também preservar empregos, vez que se trata de uma medida que confere fôlego financeiro aos contratados que eventualmente foram multados pela Administração.