L&C Comenta

A gestão e a fiscalização dos contratos de serviços terceirizados. Parte I

João Luiz Domingues

É especialista em Gestão Pública e em Orçamento Público. É Auditor Federal de Finanças e Controle no Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) e Colaborador do Portal L&C.

O L&C Comenta abordará o tema “GESTÃO E A FISCALIZAÇÃO DE CONTRATOS DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS”. O assunto foi regulamentado pela Instrução Normativa nº 5/2017 de forma detalhada, descrevendo as competências requeridas para o exercício das atribuições de gestor e de fiscal e delimitando o campo de atuação de cada um dos atores no acompanhamento e na fiscalização dos contratos administrativos.

O novel normativo infralegal apresentou diversas novidades, dentre as quais destacamos: a fiscalização setorial; fiscalização pelo público usuário; recebimentos provisórios e definitivos dos serviços; e a emissão da nota fiscal ou fatura a partir da utilização do IMR.

Contudo, o assunto será dividido em duas partes, sendo que na primeira cuidaremos da gestão dos contratos, enquanto na segunda parte o tema será destinado à fiscalização contratual.

 

Considerações Iniciais

A Instrução Normativa nº 05/2017[1] apresenta a definição das atividades de gestão e fiscalização contratual e estabelece que compete ao gestor do contrato a coordenação[2] das atividades relacionadas à fiscalização técnica, administrativa, setorial e pelo público usuário, redação semelhante à transcrita pela Instrução Normativa nº 02/2008[3], revogada pela Instrução Normativa nº 05/2017.

A atuação do gestor do contrato também se faz presente na instrução processual e no respectivo encaminhamento da documentação pertinente ao Setor de Contratos para formalização dos procedimentos que envolvam prorrogação, alteração, reequilíbrio, pagamento, eventual aplicação de sanções, extinção dos contratos de serviços terceirizados, dentre outros.

De acordo com a Instrução Normativa nº 05/2017[4], as atividades de gestão e fiscalização da execução contratual devem ser realizadas de forma preventiva, rotineira e sistemática e podem ser exercidas por Equipe de Fiscalização ou Único Servidor, desde que, no exercício dessas atribuições, fique assegurada a distinção dessas atividades e, em razão do volume de trabalho, não comprometa o desempenho de todas as ações relacionadas à Gestão do Contrato.

Em que pese a Instrução Normativa nº 05/2017 prever o exercício das atividades de gestão e fiscalização por um único servidor, entendemos que em observância ao Princípio da Segregação de Funções não poderia ser atribuído ao mesmo servidor os encargos pelos recebimentos provisório e definitivo dos serviços prestados e, portanto, deveriam ser designados para cada contrato de prestação de serviços um gestor e, pelo menos, um fiscal de contrato.

 

Atribuições do Gestor do Contrato

            O gestor do contrato, conforme descrito anteriormente, deve coordenar as atividades relacionadas à fiscalização técnica, administrativa, setorial e pelo público usuário, e encaminhar documentações relacionadas com a execução contratual ao Setor de Contratos.

Assim sendo, o gestor do contrato atua em “várias frentes” ao mesmo tempo e representa o “elo” entre a prestação de serviços e o Setor de Contratos.

O gestor do contrato tem como obrigação mensal analisar as documentações e os relatórios encaminhados pelos fiscais do contrato, podendo estes serem ficais técnico, administrativo, setorial ou equipe de fiscalização, e emitir termo circunstanciado para efeito de recebimento definitivo dos serviços prestados[5].

Portanto, o recebimento provisório dos serviços ficará a cargo do fiscal técnico, administrativo, setorial, quando houver, ou equipe de fiscalização e o recebimento definitivo a cargo do gestor do contrato, ato que concretiza o ateste da execução dos serviços.

Caso haja irregularidades que impeçam a liquidação e, consequentemente, o respectivo pagamento pelos serviços prestados, deve o gestor indicar as cláusulas contratuais pertinentes, solicitando à contratada, por escrito, as respectivas correções[6], como por exemplo, o Sicaf indicar certidões com data de validade expirada, oportunidade em que deverão ser tomadas as providências previstas no § 4º do art. 3º da Instrução Normativa nº 2, de 11 de outubro de 2010.

            Entretanto, se o edital da licitação estabelecer o Instrumento de Medição de Resultados (IMR) como mecanismo de aferição da prestação dos serviços contratados, o gestor deve comunicar à empresa para que esta emita a nota fiscal ou fatura no valor exato dimensionado pela fiscalização contratual, mais precisamente, a partir da análise efetuada pelo fiscal técnico[7].

            Entendemos, assim, que as atuações do gestor e do fiscal técnico junto à empresa contratada podem sofrer variações a depender da utilização do IMR como instrumento de avaliação da prestação de serviços. Tal fato tem respaldo no item 3.2 do Anexo VIII-A, da Instrução Normativa nº 05/2017[8], que estabelece os requisitos para atuação da fiscalização técnica.

Percebe-se de sua leitura, que a comunicação junto à empresa contratada para que esta apresente justificativas quando o nível de prestação de serviços situar-se abaixo dos padrões de aceitabilidade do IMR e a respectiva análise das argumentações encontram-se descritas como sendo atribuições do fiscal técnico. É a fase do contraditório e ampla defesa conferido à contratada.

Em havendo a rejeição aos argumentos aduzidos, deverá o fiscal técnico efetuar o registro em relatório a ser encaminhado ao gestor do contrato promovendo o redimensionamento de valores a serem pagos à empresa contratada[9]. E nesse caso, conforme informação anterior, cabe ao gestor do contrato solicitar à empresa contratada a emissão de nota fiscal ou fatura no valor exato dimensionado pela fiscalização com base no Instrumento de Medição de Resultado (IMR)[10].

            Por outro lado, na ausência de adoção de IMR, a comunicação junto à empresa contratada, caso sejam identificadas pela fiscalização contratual irregularidades na prestação de serviços, é de responsabilidade do gestor de contratos, devendo este indicar, com base nos relatórios e na documentação encaminhados pela fiscalização, as cláusulas contratuais pertinentes e solicitar à contratada, por escrito, as respectivas correções[11].

                       

Considerações Finais

O recebimento definitivo e o ateste efetuado pelo gestor do contrato não exclui as responsabilidades dos fiscais técnico, administrativo, setorial ou da equipe de fiscalização pelo recebimento provisório da prestação de serviços.

Não se pode perder de vista que o recebimento provisório e definitivo dos serviços deve ser realizado de acordo com o que estabelece os arts. 73 a 76 da Lei nº 8.666/1993 e em consonância com as regras definidas no instrumento convocatório[12], vez que compete à Administração informar ao particular as regras para aceitação da prestação de serviços e o prazo para a realização dessas atividades.

O gestor de contrato e o seu substituto deverão elaborar relatório registrando as ocorrências sobre a prestação dos serviços referentes ao período de sua atuação quando do seu desligamento ou afastamento definitivo[13].

O objetivo da norma nesse caso foi permitir aos novos servidores designados para o exercício da função de gestor do contrato, titular e substituto, tomar conhecimento do nível de execução da prestação de serviços de forma sistematizada e simplificada, de modo a possibilitar o exercício da nova atividade com maior eficiência e de resguardar o interesse público no recebimento da prestação de serviços.

As ocorrências acerca da execução contratual deverão ser registradas durante toda a vigência da prestação dos serviços, cabendo ao gesto o contrato, observadas suas atribuições, a adoção das providências necessárias ao fiel cumprimento das cláusulas contratuais, conforme o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 67 da Lei nº 8.666/1993[14][15].

O registro das ocorrências, as comunicações entre as partes e demais documentos relacionados à execução do objeto poderão ser organizados em processo de fiscalização[16].

Entendemos que a instrução em processo específico de fiscalização tem como objetivo essencial documentar todos os eventos, incluindo toda a documentação fornecida pela empresa contratada; registrar o histórico do contrato; viabilizar o rastreamento de eventos; responder a questionamentos feitos em auditorias; propor aplicação de penalidades; e servir de base para processos de contratações futuras[17].

A documentação dos eventos relacionados com a execução contratual, em especial, os referentes à verificação do cumprimento das obrigações fiscais, trabalhista, previdenciária e com o FGTS da empresa contratada e de seus empregados, constitui elemento probante da atuação administrativa quanto à fiscalização contratual e, possivelmente, fator de exclusão da Responsabilidade Subsidiária da Administração Pública constante do Enunciado TST 331, Inciso V, ainda mais com a decisão do STF por meio do Recurso Extraordinário (RE) 760931 com repercussão geral, confirmando o entendimento adotado na Ação de Declaração de Constitucionalidade (ADC) 16, que veda a responsabilização automática da administração pública, só cabendo sua condenação se houver prova inequívoca de sua culpa na fiscalização dos contratos.

Por fim, nos casos de atraso ou falta de indicação, de desligamento ou afastamento extemporâneo e definitivo do gestor e seus substitutos, até que seja providenciada a indicação, a competência de suas atribuições caberá ao responsável pela indicação ou conforme previsto no normativo de cada órgão ou entidade, de acordo com o funcionamento de seus processos de trabalho e sua estrutura organizacional[18].



[1] Art. 39. As atividades de gestão e fiscalização da execução contratual são o conjunto de ações que tem por objetivo aferir o cumprimento dos resultados previstos pela Administração para os serviços contratados, verificar a regularidade das obrigações previdenciárias, fiscais e trabalhistas, bem como prestar apoio à instrução processual e o encaminhamento da documentação pertinente ao setor de contratos para a formalização dos procedimentos relativos a repactuação, alteração, reequilíbrio, prorrogação, pagamento, eventual aplicação de sanções, extinção dos contratos, dentre outras, com vista a assegurar o cumprimento das cláusulas avençadas e a solução de problemas relativos ao objeto.

[2] Art. 40, Inciso I.

[3] Art. 31.  O acompanhamento e a fiscalização da execução do contrato consistem na verificação da conformidade da prestação dos serviços e da alocação dos recursos necessários, de forma a assegurar o perfeito cumprimento do contrato, devendo ser exercido pelo gestor do contrato, que poderá ser auxiliado pelo fiscal técnico e fiscal administrativo do contrato. (Redação dada pela Instrução Normativa nº 6, de 23 de dezembro de 2013)

[...]

§ 2º Para efeito desta Instrução Normativa, considera-se: (Incluído pela Instrução Normativa nº 6, de 23 de dezembro de 2013)

I - gestor do contrato: servidor designado para coordenar e comandar o processo da fiscalização da execução contratual

[4] Art. 40, § 3º.

[5] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 50, Inciso II, alínea c.

[6] Art. 50, Inciso II, alínea a.

[7] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 50, Inciso II, alínea c.

[8] 3.2. A contratada poderá apresentar justificativa para a prestação do serviço com menor nível de conformidade, que poderá ser aceita pelo fiscal técnico, desde que comprovada a excepcionalidade da ocorrência, resultante exclusivamente de fatores imprevisíveis e alheios ao controle do prestador.

[9] Instrução Normativa nº 05/2017, Anexo IV, item 4.

[10] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 50, Inciso II, alínea c.

[11] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 50, Inciso II, alínea a.

[12] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 49.

[13] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 42, § 3º.

[14] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 46.

[15] Art. 67.  A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.

§ 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.

§ 2º As decisões e providências que ultrapassarem a competência do representante deverão ser solicitadas a seus superiores em tempo hábil para a adoção das medidas convenientes.

[16] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 46, § 1º.

[17] Acórdão nº 1.094/2013-Plenário.

[18] Instrução Normativa nº 05/2017, art. 41, § 3º.