L&C Comenta
A gestão e a fiscalização dos contratos de serviços terceirizados. Parte II
João Luiz Domingues
É especialista em Gestão Pública e em Orçamento Público. É Auditor Federal de Finanças e Controle no Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) e Colaborador do Portal L&C.
O L&C Comenta de hoje, em continuidade à publicação anterior, apresenta o tema a “Gestão e a fiscalização de contratos de serviços terceirizados. Parte II”.
A abordagem recairá sobre os tipos de fiscais e as respectivas atribuições e competências. Sobre este aspecto, a Instrução Normativa nº 05/2017 trouxe algumas novidades acerca desse assunto.
Considerações Iniciais
Conforme informado no L&C Comenta anterior, a Instrução Normativa nº 05/2017 conferiu ao Gestor do Contrato a competência para coordenar as atividades relacionadas à fiscalização técnica, administrativa, setorial e pelo público usuário.
Destarte, a Instrução Normativa nº 05/2017 inaugurou em seu texto as Atividades de Fiscalização Técnica, Administrativa, Setorial e Público Usuário como assessórias ou auxiliares à competência dirigida ao gestor do contrato.
As competências do Fiscal Técnico estão relacionadas com a avaliação da execução do objeto, podendo ser auxiliado pela Fiscalização realizada pelo Público Usuário.
O Fiscal Administrativo se faz necessário apenas nos contratos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra quanto às obrigações previdenciárias, fiscais e trabalhistas.
O Fiscal Setorial se faz necessário quando a prestação de serviços ocorre em mais de um local de forma concomitante, ou seja, a execução se faz de forma descentralizada. Ao servidor designado para o exercício da fiscalização setorial, compete exercer as atividades atribuídas aos Fiscais Técnico e Administrativo, contudo, veremos mais adiante que essa regra comporta algumas particularidades.
A Fiscalização pelo Público Usuário é o acompanhamento da execução contratual por pesquisa de satisfação junto ao público usuário.
A Instrução Normativa nº 05/2017[1] prevê, ainda, que a atividade de fiscalização pode ser realizada por Equipe de Fiscalização ou um único servidor, sendo este último tópico tratado no L&C Comenta “A gestão e a fiscalização dos contratos de serviços terceirizados. Parte I.
Manual de Fiscalização
Visando melhor eficiência nas atividades de fiscalização contratual estabelecidas pela Instrução Normativa nº 05/2017, faz-se necessário que cada órgão ou entidade elabore Manual de Fiscalização ou Plano de Fiscalização.
O documento de fiscalização elaborado deverá conter informações acerca das obrigações contratuais; dos mecanismos e metodologias de fiscalização; das estratégias para execução do objeto; do método de aferição dos resultados; e das sanções aplicáveis, dentre outros.
O manual ou plano de fiscalização deve ser concebido na fase de planejamento da contratação e entendemos que pode ser elaborado de forma genérica, de modo a abranger a atuação dos fiscais para todo e qualquer tipo de contrato ou exclusivamente para cada tipo de serviço contratado.
A Instrução normativa nº 05/2017[2] prescreve que o plano de fiscalização deve ser apresentado à empresa em reunião anteriormente ao início da prestação de serviços.
Não obstante essa previsão, entendemos que o procedimento de fiscalização e gerenciamento do contrato deve constar do termo de referência[3], documento anexo ao instrumento convocatório, de modo a possibilitar que as empresas interessadas a participarem do certame possam tomar conhecimento da forma pela qual a Administração irá fiscalizar a execução contratual.
O manual de fiscalização deve prever, dentre outras ações, as competências e atribuições dos servidores designados para atuarem como fiscais do contrato; a definição do percentual de empregados a ser fiscalizado mensalmente; da periodicidade da fiscalização; dos itens avaliados mensalmente; da documentação a ser solicitada à empresa contratada de forma a complementar a fiscalização; e da realização de fiscalização por fato gerador - férias, décimo terceiro, aumento do piso salarial, por exemplo.
Uma boa prática a ser adotada na realização de fiscalização junto aos empregados por amostragem seria a aplicação de questionário e/ou entrevistas de modo a verificar o adimplemento das obrigações trabalhistas por parte da empresa contratada, como por exemplo, o pagamento de salários, vale transporte, auxilio alimentação, férias e décimo terceiro, bem como o depósito do FGTS e recolhimento da Contribuição Previdenciária.
Nessa esteira, citamos, a título de referência, a Portaria TCU nº 297, 14 de novembro de 2012[4], que em seus Anexos I a IV, apresenta os modelos de questionários a serem utilizados durante a atuação da fiscalização contratual em seu âmbito interno.
O manual de fiscalização deve ser seguido da elaboração de modelos de ofícios de comunicação junto à empresa contratada, como por exemplo, solicitação de esclarecimentos e/ou justificativas; solicitação informações; apuração de irregularidades; e aplicação de penalidades e rescisão contratual.
O Caderno de Logística de sanções Administrativas[5], elaborado pela então Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI), traz em sua fls. 42 os modelos disponibilizados pela Advocacia-Geral da União, com adaptações.
Portanto, a elaboração do Manual de Fiscalização traz importantes pontos positivos à Administração, dentre outros:
a) Promover a realização de ações de padronizadas de fiscalização;
b) Estabelecer competências e atribuições para os servidores que atuam na fiscalização dos serviços terceirizados;
c) Fortalecer a eficiência administrativa na ação fiscalizatória dos contratos de serviços terceirizados;
d) Propiciar maior segurança aos fiscais de contrato quando da realização das respectivas atividades técnica, administrativa ou setorial; e
e) Criar “Cultura de Fiscalização” da Administração junto às empresas contratadas.
Fiscalização Contratual
Anteriormente a adentrarmos nas atribuições dos fiscais de contratos, independentemente de sê-lo fiscal técnico, administrativo ou setorial, devemos reconhecer qual o objetivo da fiscalização contratual.
De acordo com a Portaria TCU nº 297/2012[6], “Fiscalização de contrato de serviço terceirizado de natureza continuada é o conjunto de procedimentos destinados à verificação da conformidade da prestação dos serviços e da alocação dos recursos necessários, de forma a assegurar o cumprimento do objeto do contrato, bem como da regularidade fiscal, trabalhista e previdenciária das contratadas e de seus empregados”.
Portanto, a fiscalização contratual visa, ao acompanhar a execução contratual, “buscar informações” quanto aos aspectos qualitativos e quantitativos da prestação de serviços, bem como do adimplemento das obrigações contratuais, legais, trabalhistas e previdenciárias pela empresa contratada.
Os Fiscais técnico, administrativo, setorial ou equipe de fiscalização serão responsáveis pelo recebimento provisório da prestação de serviços, a partir da emissão de relatórios circunstanciados.
Quando a fiscalização for exercida por um único servidor, o relatório circunstanciado deverá conter o registro, a análise e a conclusão acerca das ocorrências na execução do contrato, em relação à fiscalização técnica e administrativa e demais documentos que julgar necessários, devendo encaminhá-los ao gestor do contrato para recebimento definitivo[7].
Atribuições Específicas do Fiscal Técnico e Setorial
A fiscalização técnica visa avaliar a execução o contratual quanto à qualidade da prestação de serviços. Essa avaliação poderá ser realizada diária, semanal ou mensal, desde que o período escolhido seja suficiente para avaliar ou, se for o caso, aferir o desempenho e qualidade da prestação dos serviços.
O Fiscal Técnico e o Fiscal Setorial, quando no desempenho da Fiscalização Técnica, podem utilizar o IMR para aferir a qualidade do serviço. A utilização do IMR não é obrigatória, contudo, se durante a fase do planejamento da contratação ficar estabelecido o seu emprego, o IMR deve ser um dos anexos do instrumento convocatório.
A utilização do IMR tem como objetivo primário o redimensionamento do pagamento devido à empresa contratada, com base nos indicadores estabelecidos, sempre que a contratada[8]:
a) não produzir os resultados, deixar de executar, ou não executar com a qualidade mínima exigida as atividades contratadas; ou
b) deixar de utilizar materiais e recursos humanos exigidos para a execução do serviço, ou utilizá-los com qualidade ou quantidade inferior à demandada.
Podemos concluir, a partir do descrito na alínea ‘b’ acima, que a falta de substituição do empregado faltoso e/ou o não fornecimento de materiais contratados não será glosado da nota fiscal ou fatura como atualmente é feito, e sim redimensionado pela utilização do IMR.
Para efeito de recebimento provisório, ao final de cada período mensal, o Fiscal Técnico do contrato deverá apurar o resultado das avaliações da execução do objeto e, se for o caso, a análise do desempenho e qualidade da prestação dos serviços realizados em consonância com os indicadores previstos no ato convocatório, que poderá resultar no redimensionamento de valores a serem pagos à contratada, registrando em relatório a ser encaminhado ao gestor do contrato[9].
O fiscal técnico e/ou fiscal setorial, quando for o caso, deverá apresentar ao preposto da contratada a avaliação da execução do objeto ou, se for o caso, a avaliação de desempenho e qualidade da prestação dos serviços realizada, e solicitá-lo a aposição da assinatura no documento, de modo a tomar ciência da avaliação realizada.
A comunicação junto à contratada é realizada pelo fiscal técnico sempre que a avaliação da prestação do serviço representar menor nível de conformidade, devendo ser conferido prazo para manifestação, em regra de 05 (cinco) dias úteis.
Caso as alegações aduzidas não sejam aceitas pelo fiscal técnico, a nota fiscal ou fatura deve ser emitida com base nos apontamentos efetuados pelo fiscal técnico ou setorial, cabendo ao gestor do contrato comunicar a empresa do valor exato dimensionado pela fiscalização com base no Instrumento de Medição de Resultado (IMR).
Atribuições Específicas do Fiscal Administrativo e Setorial
Somente haverá fiscalização administrativa se o serviço for prestado com regime de dedicação exclusiva de mão de obra[10]. O Fiscal Técnico poderá desempenhar de forma concomitante as Fiscalizações Técnica e Administrativa, contudo, deve emitir termos recebimentos provisórios distintos às atividades técnica e administrativa.
A atuação do Fiscal Administrativo e do Fiscal Setorial, quando no desempenho da Fiscalização Administrativa, deverá ocorrer em “momentos pré-determinados” durante a execução contratual: Fiscalização Inicial; Fiscalização Mensal; Fiscalização Diária; Fiscalização Procedimental; e Fiscalização por Amostragem.
Na Fiscalização Inicial ressaltamos a importância da elaboração da planilha-resumo para a operacionalização da Conta Vinculada ou pagamento pelo Fato Gerador, vez que os valores repassados à contratada para pagamento dos benefícios aos trabalhadores devem ser proporcionais ao tempo em que estes estejam alocados no contrato com a Administração.
Na Fiscalização Mensal, a atividade de fiscalização consiste em conferência documental, consulta de Sicaf, retenção tributária e previdenciária.
Na fiscalização Diária, destacamos a conferência por amostragem, diariamente, dos empregados terceirizados que estão prestando serviços e em quais funções, e se estão cumprindo a jornada de trabalho.
Na Fiscalização Procedimental, a importância reside em verificar se o empregado está recebendo o piso salarial e demais benefícios previstos pela nova CCT em virtude da data-base da categoria, bem como a concessão e o pagamento de férias e décimo terceiro salário devidos pela empresa contratada.
A Fiscalização por Amostragem visa verificar se a empresa contratada está cumprindo com as obrigações trabalhistas e previdenciárias e efetuando o recolhimento das contribuições previdenciárias e o depósito do FGTS em nome dos empregados alocados no contrato com a Administração.
O objetivo, conforme descrito pelo L&C Comenta “A gestão e a fiscalização dos contratos de serviços terceirizados. Parte I, é resguardar a Administração da Responsabilização Subsidiaria decorrente da aplicação do Enunciado TST 331[11] em virtude inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
Acreditamos que o processo de fiscalização autuado é fator essencial para elidir a responsabilização da Administração frente aos débitos trabalhistas não honrados pela empresa contratada, desde que fique evidenciada a atuação do fiscal de contratos.
A Instrução Normativa nº 05/2017[12] estabelece os procedimentos a serem executados de modo a resguardar a Administração, como por exemplo, a solicitação por amostragem do extrato da conta do INSS e do FGTS de qualquer empregado; cópia da folha de pagamento analítica de qualquer mês da prestação dos serviços, em que conste como tomador o órgão ou entidade contratante; cópia dos contracheques assinados dos empregados ou cópia de recibos de depósitos bancários; e comprovantes de entrega de benefícios suplementares: vale-transporte, vale-alimentação, entre outros.
Podem ser adotados outros procedimentos de fiscalização, como por exemplo, a aplicação de questionários e entrevistas como ferramentas de aferição do cumprimento das obrigações pela contratada, os quais ao final devem ser juntados ao processo administrativo de fiscalização.
Considerações Finais
O órgão ou entidade pode, considerando as suas particularidades, como por exemplo, a sua estrutura e quantidade de servidores que poderiam atuar como gestores e fiscais de contratos, adotar modelo diverso do propugnado pela Instrução normativa nº 05/2017.
O importante que o modelo adotado se apresente de forma eficiente e resguarde a Administração Pública da imputação de Responsabilidade Subsidiária decorrente de débitos trabalhistas decorrentes da aplicação do Enunciado TST 331.
Entendemos que a plena implementação da gestão e fiscalização preconizada pela Instrução Normativa nº 05/2017 representará um dos maiores desafios a serem superados pela maioria dos órgãos e entidades. Motivo: Falta de Servidores!!!
Alguns órgãos têm superado esse cenário com a implementação da Gestão e a Fiscalização Administrativa Centralizadas. Aproveitamos a oportunidade para citar o exemplo da Universidade de Brasília (UnB), em que que foi criada na estrutura da Instituição de ensino a Diretoria de Terceirização (DTer), sendo o seu Diretor designado para atuar como Gestor de todos os contratos de serviços terceirizados prestados com dedicação exclusiva de mão de obra.
Todos os fiscais administrativos estão alocados na DTer e possuem as atribuições de analisar as documentações encaminhadas pela empresa contratada; as repactuações e reajustes pleiteados; as folhas de frequência, bem como verificar se a contratada está adimplindo com suas obrigações trabalhistas, previdenciária e fiscais.
Por seu turno, o TCU[13] define gestão de contrato como sendo a unidade ou subunidade de sua Secretaria, vinculada ou não ao objeto do contrato, responsável pela fiscalização da documentação comprobatória da contratada, cabendo ao fiscal técnico[14] acompanhar a execução dos serviços terceirizados de natureza continuada que tenham sido contratados. Portanto, no TCU não existe designação de servidor para realização de fiscalização administrativa, vez que a fiscalização das atividades administrativas está a cargo da unidade ou subunidade responsável pela gestão do contrato.
Por fim, no caso de o gestor e os fiscais de contrato serem substituídos por outros servidores devem ser elaborados relatórios registrando as informações quanto à prestação de serviços referentes ao período de sua atuação. A obrigação se estende ao respectivos substitutos quando deixar de exercer o encargo que lhe foi confiado.
[1] Art. 40, § 3º.
[2] Art. 45.
[3] Decreto nº 5.450/2005, Art. 9º, § 2º.
[4] Portaria-TCU nº 297, de 14 de novembro de 2012, dispõe sobre a fiscalização dos contratos de prestação de serviços terceirizados de natureza continuada no âmbito da Secretaria do Tribunal de Contas da União.
[5] http://www.comprasgovernamentais.gov.br/images/conteudo/ArquivosCGNOR/caderno-de-logistica-de-sancao-2.pdf.
[6][6] Art. 2º, Inciso II.
[7] Art. 50, Inciso I, alínea b.
[8] Instrução Normativa nº 05/2017, Anexo VIII-A, Item 1.
[9] Instrução Normativa nº 05/2017, Anexo VIII-A, Item 4.
[10] Art. 17, parágrafo único.
[11]V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, as mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
[12] Anexo VIII-B, Item 10.5, da Instrução Normativa nº 05/2017.
[13] Portaria nº 297/2012, art. 2º, Inciso III.
[14] Portaria nº 297/2012, art. 2º, Inciso V.