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Comentários sobre a nova Instrução Normativa sobre Pesquisa de Preços

Daniel Barral

Mestrando em Direito Público pela Universidade Nova de Lisboa, Procurador Federal da Advocacia-Geral da União e Colaborador do Portal L&C.

Recentemente o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão expediu a Instrução Normativa nº 03, de 20 de abril de 2017, que alterou a Instrução Normativa nº 5, de 27 de junho de 2014, redefinindo a sistemática de realização de pesquisa de preços, além de ter apresentado a nova ferramenta de pesquisa de preços, denominada de Painel de Preços.

É importante destacar que a pesquisa de preços bem feita é uma etapa essencial para o sucesso de qualquer licitação, pois ela permite a correta estimativa do custo do objeto a ser adquirido, define os recursos orçamentários suficientes para a cobertura das despesas contratuais e serve de balizamento para a análise das propostas dos licitantes, conforme dispõem os arts. 7º, § 2º, II, 15, V e § 1º, 40, § 2º, II, 43, incisos IV e V, todos da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993[1];

            Como forma de demonstrar a importância atribuída pela Lei Geral de Licitações ao preço pago pela Administração em suas aquisições, é pertinente recordar que o art. 15, § 6º[2], conferiu poder a qualquer cidadão para impugnar um preço registrado, se incompatível com o preço vigente no mercado. De igual modo, o art. 24, VII[3], facultou à Administração Pública a contratação direta de bem ou serviço cuja licitação anterior tenha recebido propostas com preços manifestamente superiores àqueles praticados no mercado nacional, sem olvidar que o art. 43, IV[4], determinou a desclassificação dos preços desconformes ou incompatíveis com os preços correntes de mercado.

Dada a importância do conceito de preço de mercado, precisamos investigar sua definição. De acordo com o Manual de Licitações e Contratos do TCU[5], o preço de mercado de determinado produto é aquele que se estabelece na praça pesquisada, com base na oferta e na procura.

Assim, podemos afirmar que a obtenção da economicidade das contratações públicas, norma derivada dos princípios da eficiência e moralidade, constitui uma obrigação comprometida com o real atendimento da finalidade imposta pela lei, independentemente do mecanismo escolhido pelo Gestor para o seu atingimento.

É neste sentido, inclusive, que se posicionou o Tribunal de Contas da União no Acórdão nº 335/2007 – Plenário, ao destacar que, a despeito da ausência de disposição legal estabelecendo o método de verificação da conformidade das propostas com os preços correntes no mercado, subsiste para o gestor público a obrigação da obtenção de preços favoráveis ao erário:

 

3.2.3.11          A Lei 8.666, de 21 de junho de 1993, não estabelece, de fato, método de verificação da conformidade de cada proposta com os preços correntes no mercado, cuja observância e eventual desclassificação em caso de não-conformidade faz obrigatória na forma do seu art. 43, inciso IV. Evidentemente, tal não desobriga o agente público de fazer tal verificação de modo criterioso. Porque se constitui mesmo num dever seu, em vista do princípio da moralidade administrativa, empreender a obtenção dos preços exeqüíveis mais favoráveis ao Erário, o que é possível a partir de um parâmetro bem estabelecido por meio da verificação cuidadosa de conformidade aludida. (grifo nosso)

 

Dito isto, e tomando por base que o levantamento de preços deve necessariamente atingir o fim último que consiste na obtenção de preços mais vantajosos para a Administração Pública, é possível concluir que a metodologia utilizada deve ser aquela que seja suficiente para o atingimento da finalidade legal almejada, consistente na obtenção da proposta mais vantajosa.

Assim, a IN nº 5, de 2014, como destacado no Parecer nº 12/2014/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU, teve como principal objetivo estabelecer parâmetros mínimos a serem seguidos pelos gestores públicos nos seus processos de aquisições, não constituindo óbice para que estes façam as adaptações ou complementações necessárias do procedimento diante das particularidades do caso concreto.

Neste sentido, a Instrução Normativa nº 03, de 20 de abril de 2017 que alterou a Instrução Normativa nº 5, de 27 de junho de 2014, buscou ajustar o procedimento original à esta sistemática mais maleável, conforme passaremos a demonstrar.

A primeira inovação digna de nota, é a inserção do Painel de preços como parâmetro válido de pesquisa de preços, em substituição à pesquisa ao Portal de Compras Governamentais. A alteração é bem-vinda, pois a nova ferramenta de gestão apresentada pelo MPDG permitirá a pesquisa, análise e comparação das compras públicas homologadas no Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais, o Siasg, de modo mais fácil e ágil se comparado ao método anterior.

Outro ponto de destaque é que não mais se autoriza a realização de pesquisa de preços com base em um único preço consultado no antigo portal de compras governamentais, nem existe, como havia, orientação para a utilização isolada de um dos quatros parâmetros constantes no art. 2º da referida Instrução Normativa.

Esta alteração busca reconduzir as disposições regulamentares à orientação jurisprudencial existente antes da edição IN nº 5, de 2014. Com efeito, o Tribunal de Contas da União – TCU, já faz algum tempo, pacificou sua jurisprudência no sentido de que o orçamento estimativo da contratação deve ser elaborado mediante consulta a fontes diversificadas, a fim de conferir maior segurança no que diz respeito à fixação dos valores dos itens ou serviços a serem adjudicados, mostrando-se inadequada a sua elaboração com base apenas em consulta a fornecedores. (AC-1678-27/15-P - AUGUSTO SHERMAN)

É importante consignar que mesmo sob a vigência da redação original da IN nº 5, de 2014, que permitia, em tese, a elaboração de orçamento com base em apenas um preço constante do portal de Compras Públicas, o TCU não admitia a restrição da fonte de consultas, por entender que as contratações públicas devem se basear em valores aceitáveis, que se encontrem dentro da faixa usualmente praticada pelo mercado em determinada época, obtida por meio de pesquisa a partir de fontes diversas.

A propósito do tema de fontes diversas, registramos que a disposição do §1º do art. 2º da IN nº 3, de 2017, que privilegia o uso dos parâmetros contidos nos incisos I e II do art. 1º, quais sejam, o painel de pesquisa de preços e contratações similares de outros órgãos públicos, está concorde com a orientação do TCU, conforme constou no Acórdão 1445/2015-Plenário.

Outra novidade que julgamos importante destacar é aquela disposta nos §§ 2º a 5º do art. 2º da IN nº 3, de 2017. Como vimos, o TCU avalia que o preço aceitável é aquele que não representa claro viés em relação ao contexto do mercado, ou seja, abaixo do limite inferior ou acima do maior valor constante da faixa identificada para o produto ou serviço.

Por sua vez, a definição deste preço aceitável reclama do setor competente a utilização da metodologia de obtenção do preço mais ajustada às particularidades do objeto pretendido pela Administração, uma vez que as características dos mercados consultados podem recomendar a mudança da metodologia de definição do preço estimado, com o objetivo de aproximar a estimativa estatal ao preço alvo do objeto desejado pelo órgão licitante.

Bem por isto, julgamos salutar que a IN nº 3, de 2017 tenha deixado claro que pode ser empregado qualquer critério ou metodologia, desde que devidamente justificados pela autoridade competente. Por óbvio, este juízo a respeito da definição do preço aceitável exige do responsável uma avaliação criteriosa e fundamentada dos elementos relevantes de análise.

Há que se reconhecer que esta é uma das etapas mais complexas do processo de compra pública, especialmente pela profunda assimetria de informação normalmente existente entre o servidor público encarregado pela condução do processo da pesquisa de preços e o mercado pesquisado ou mesmo em relação aos critérios de análise crítica dos dados obtidos.

É por isto que se sugere que os órgãos licitantes façam uso do permissivo constante no art. 115 da Lei nº 8.666, de 1993 e editem normas complementares e mais detalhadas a respeito do procedimento de pesquisa de preços. Um bom exemplo, apto a servir de inspiração neste processo de regulamentação interna do procedimento, é a Portaria nº 128, de 14 de maio de 2014 do TCU.

             

 

 



[1] Estes aspectos são destacados pela iterativa jurisprudência do tribunal de Contas da União sobre a matéria. Confira em caráter exemplificativo as Decisões nº 431/1993, 288/1996, 386/1997 - TCU Plenário, e os Acórdãos nº 195/2003, 1060/2003, 463/2004, 1182/2004 Plenário, Acórdão nº 64/2004, 254/2004, 828/2004, 861/2004 Segunda Câmara; acordão 428/2010 – 2ª Câmara.

[2] Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão: 

(...)

§ 6o Qualquer cidadão é parte legítima para impugnar preço constante do quadro geral em razão de incompatibilidade desse com o preço vigente no mercado.

[3] Art. 24.  É dispensável a licitação: 

(...)

VII - quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes, casos em que, observado o parágrafo único do art. 48 desta Lei e, persistindo a situação, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços, ou dos serviços;

[4] Art. 43.  A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos:

(...)

IV - verificação da conformidade de cada proposta com os requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados por órgão oficial competente, ou ainda com os constantes do sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente registrados na ata de julgamento, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis;

 

[5] Brasil. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos : orientações e jurisprudência do TCU / Tribunal de Contas da União. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília : TCU, Secretaria-Geral da Presidência : Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010. P. 87;