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Congresso Nacional rejeita vetos a cinco dispositivos da Nova Lei de Licitações

Daniel Barral

Mestrando em Direito Público pela Universidade Nova de Lisboa, Procurador Federal da Advocacia-Geral da União e Colaborador do Portal L&C.

 

Colaborou com este LC comenta:

Kauana Rodrigues

Colaboradora do Portal L&C

Bacharelanda em Direito

 

 

A derrubada dos vetos

Em sessão conjunta realizada no dia 01º de junho de 2021, o Congresso Nacional decidiu por rejeitar os vetos presidenciais a cinco dispositivos da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 que, após a promulgação das partes vetadas pelo Presidente da República (disponível aqui) agora passa a viger com a reinserção dos seguintes dispositivos:

 

Art. 37  (...)

§ 2º  Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, na licitação para contratação dos serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual previstos nas alíneas “a”, “d” e “h” do inciso XVIII do caput do art. 6º desta Lei cujo valor estimado da contratação seja superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), o julgamento será por:

I - melhor técnica; ou

II - técnica e preço, na proporção de 70% (setenta por cento) de valoração da proposta técnica.”

Art. 54  (...)

§ 1º Sem prejuízo do disposto no caput, é obrigatória a publicação de extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, bem como em jornal diário de grande circulação.

.......................................................”

Art. 115  (...)

§ 4º Nas contratações de obras e serviços de engenharia, sempre que a responsabilidade pelo licenciamento ambiental for da Administração, a manifestação prévia ou licença prévia, quando cabíveis, deverão ser obtidas antes da divulgação do edital.”

Art. 175  (...)

§ 2º Até 31 de dezembro de 2023, os Municípios deverão realizar divulgação complementar de suas contratações mediante publicação de extrato de edital de licitação em jornal diário de grande circulação local.”

 

Passaremos a analisar os impactos das reinserções destes dispositivos na Lei 14.133, de 2021.

 

Incisos I e II do §2º do art. 37

            Os dois primeiros vetos rejeitados pelo legislativo correspondem aos Incisos I e II do §2º do art. 37 da Lei nº 14.133, de 2021 que impõem o julgamento por melhor técnica e técnica e preço nos serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual previstos nas alíneas ‘a’, ‘d’ e ‘h’ do inciso XVIII do caput do art. 6º cujo valor estimado da contratação seja superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais).

Considerando que as três alíneas indicadas na regra em comento englobam todos os serviços de engenharia enquadrados no gênero de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e, ainda, que os dispositivos adotam termos amplos e vagos como “estudos técnicos” e “planejamentos”, grafados assim mesmo, no plural, o que indicam múltiplas situações enquadráveis em suas disposições e, ainda, considerando que a alínea “h” possui regra de fechamento que admite o enquadramento dos “demais serviços de engenharia que se enquadrem na definição deste inciso”, é seguro dizer que a contratação de qualquer serviço técnico especializado de natureza predominantemente intelectual de engenharia acima do valor de trezentos mil reais deverá adotar um dos dois critérios de julgamento que levem em consideração aspectos técnicos para a seleção da melhor proposta.

Ademais, esta regra não discrepa do comando contido no 36 § 1º, I da Lei nº 14.133, de 2021[i] que já atribuía caráter preferencial à adoção destes critérios para todos os serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual.

Assim, com a manutenção destas disposições, criam-se duas regras. A uma, instituiu-se presunção legal de que as contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual de engenharia que superem a alçada de trezentos mil reais são serviços complexos e que não podem ser licitados pela modalidade pregão.

A duas, caso opte pelo critério técnica e preço, o gestor necessariamente deve adotar a proporção de 70% para a técnica, não podendo fazer uso do gradiente facultado pelo art. 36, § 2º da Lei.

 

Do §1º do art. 54

            O terceiro veto rejeitado faz retornar a obrigação de publicação de extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, bem como em jornal diário de grande circulação.

Alvo de muita controvérsia, a determinação de publicação em jornal de grande circulação foi entendida pelo Poder Executivo como contrária ao interesse público, sob o argumento de se tratar de medida desnecessária e antieconômica, uma que a divulgação em ‘sítio eletrônico oficial’ por si só atenderia a necessária publicidade do ato convocatório.

Com efeito, uma das grandes inovações da Lei nº 14.133, de 2021 foi a instituição do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), que seria uma central de publicização de todos os atos relativos às contratações públicas, inclusive os editais dos procedimentos licitatórios, com a adoção de formato de dados abertos, ou seja, que possibilitem o acesso automatizado por sistemas externos em formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina.

Aqueles que são críticos da medida sustentam que o efetivo alcance da informação, em um mundo conectado e globalizado, ocorre pela internet e não em veículos tradicionais. Por outro lado, há que se reconhecer, parafraseando Darci Ribeiro, que existem muitos Brasis dentro do Brasil, e a exigência de publicidade em veículos tradicionais pode atender as necessidades de mercados fornecedores em rincões nacionais, ainda pouco afetas às tecnologias de comunicação.

 

Do §4º do art. 115

O terceiro e penúltimo veto a ser rejeitado trata de contratações de obras e serviços de engenharia, e impõe ao Poder Público, quando o licenciamento ambiental for de sua responsabilidade, a obtenção da manifestação prévia ou licença prévia antes da divulgação do edital.

            Em regra, os processos licitatórios para a contratação de serviços desse tipo levam meses, os agentes públicos precisam dedicar tempo a realização do processo, deve haver estudos, além de ser necessário empregar recursos públicos que, por vezes, acabam desperdiçados. Nesse sentido, com a emissão prévia da licença, a Administração pode conseguir reduzir o risco de atrasos na execução dos contratos.

            Havia-se vetado o dispositivo com justificativa de ser um impedimento a realização das chamadas Licitações Integradas, que têm a elaboração do projeto básico após a celebração do contrato, o que supostamente seria um impedimento à emissão da licença prévia. Entretanto, não nos parece uma justificativa sólida, vez que, por meio do anteprojeto e do edital, é possível que se conheça as necessidades do objeto a ser contratado, sendo possível atender às exigências para a emissão do licenciamento ambiental previamente.

            Sendo assim, parece-nos razoável que a Administração, antes de lançar um edital à praça, busque o licenciamento ambiental, a manifestação ou licença prévias, levando em consideração a busca pela máxima eficiência administrativa.

 

Do §2º do art. 175

            Por fim, o último veto rejeitado foi o §2º do art. 175, que trata da divulgação de editais por parte dos Municípios, vejamos:

“§ 2º Até 31 de dezembro de 2023, os Municípios deverão realizar divulgação complementar de suas contratações mediante publicação de extrato de edital de licitação em diário de grande circulação local.”

            Percebe-se que esse dispositivo é, na verdade, consequência da derrubada do veto do §1º do art. 54, visto que ambos tratam da publicização dos atos de contratação na imprensa.

            Quanto a este não há muito que comentar. Nota-se que preconiza a maior transparência da atuação administrativa, o que potencializa o controle da atuação estatal por parte da sociedade, além dos órgãos de controle, quando cabível ao ente municipal.

 



[i] Art. 36. O julgamento por técnica e preço considerará a maior pontuação obtida a partir da ponderação, segundo fatores objetivos previstos no edital, das notas atribuídas aos aspectos de técnica e de preço da proposta.

§ 1º O critério de julgamento de que trata o caput deste artigo será escolhido quando estudo técnico preliminar demonstrar que a avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem os requisitos mínimos estabelecidos no edital forem relevantes aos fins pretendidos pela Administração nas licitações para contratação de:

I - serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual, caso em que o critério de julgamento de técnica e preço deverá ser preferencialmente empregado;