L&C Comenta
A dispensa de licitação para contratação de instituição brasileira na ótica do TCU

Rafael Sérgio de Oliveira
É doutorando em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, Mestre em Direito e Especialista em Direito Público. Participou do Programa de Intercâmbio Erasmus+, desenvolvendo pesquisa na área de Direito da Contratação Pública na Università degli Studi di Roma - Tor Vergata. É Procurador Federal da Advocacia-Geral da União (AGU) e Colaborador do Portal L&C.
O
L&C Comenta traz à análise os requisitos para a contratação direta de
instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do
ensino ou do desenvolvimento institucional, ou dedicada à recuperação social do
preso, conforme previsto no art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/1993. As hipóteses
de contratação direta são sempre rodeadas de controvérsias e isso não é
diferente com a situação em estudo.
O
delineamento dos elementos necessários para a dispensa de licitação com base no
art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/1993, é uma problemática presente na atividade
daqueles que lidam com as contratações da Administração Pública. A Corte de
Contas Federal já se debruçou diversas vezes sobre o tema, sendo possível
identificar nas decisões do TCU alguns requisitos essenciais para a contratação
por dispensa de licitação de instituição brasileira voltada para o ensino, para
o desenvolvimento institucional ou para a recuperação social do preso.
O
inciso XIII, do art. 24, da Lei nº 8.666/1993, prevê a dispensabilidade de licitação
de instituição brasileira com o seguinte texto:
Art. 24. É
dispensável a licitação:
(...)
XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento
institucional, ou de instituição dedicada
à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional
e não tenha fins lucrativos; (grifo
nosso)
Pela
letra do dispositivo legal é possível asseverar que são requisitos para tal
caso de dispensa de licitação: a) que a instituição seja brasileira; b) que a
instituição tenha inquestionável reputação ético-profissional; c) que a
instituição não tenha fins lucrativos; d) que o regimento ou o estatuto da
instituição estabeleça que ela tem como incumbência uma das seguintes
atividades: i) a pesquisa; ii) o ensino; iii) o desenvolvimento institucional;
iv) a recuperação social do preso.
Conforme
noticiado no Informativo de Licitações e Contratos nº 307 do TCU, o Tribunal
manifestou-se acerca dessa hipótese de contratação direta no Acórdão nº 2669/2016 – Plenário, cujo
Relator foi o Ministro Benjamin Zymler. Em seu voto, o referido Ministro
afirmou que a dispensa de licitação com base no inciso XIII, do art. 24, da Lei
de Licitações e Contratos Administrativos – LLCA, “exige comprovação cumulativa dos seguintes requisitos: ser brasileira, não ter fins lucrativos, apresentar
inquestionável reputação ético-profissional, ter como objetivo estatutário-regimental a pesquisa, o ensino ou o desenvolvimento institucional,
deter reputação ético-profissional na
estrita área para a qual está sendo contratada” (grifo nosso).
Do
voto do Ministro Benjamin Zymler se extrai a necessidade de pertinência entre a
reputação ético-profissional da futura contratada e o objeto do contrato. É
dizer que a empresa necessita comprovar que tem reputação ético-profissional na
área correlata ao objeto contratual. Por exemplo, se o objeto do contrato é o
desenvolvimento do planejamento estratégico de uma entidade pública, deve a
instituição brasileira a ser contratada comprovar que tem competência
profissional e reputação ética ilibada no campo da gestão estratégica.
Ainda
sobre a necessidade de correlação entre a incumbência regimental ou
estatutária, a experiência (competência) da contratada e o objeto contratual,
devemos mencionar as palavras do Ministro Raimundo Carrero no voto do Acórdão nº 1391/2012 – Plenário, relatado
pelo referido Ministro: "... este
Tribunal entende que a contratação direta prevista no art. 24, inciso XIII, da
Lei nº 8.666/93 só é possível quando houver nexo entre o objeto do contrato e
as atividades de ensino, pesquisa e desenvolvimento institucional
necessariamente previstas nos estatutos da entidade prestadora dos serviços..."
(sobre a necessidade de nexo entre a incumbência da contratada e o objeto
contratual: Acórdão nº 898/2012 – Plenário; Acórdão nº 2506/2013 – Segunda
Câmara; e Acórdão nº 1828/2015 – Primeira Câmara).
De
notar que o TCU editou as Súmulas nº 250
e 287, expressando em seu texto
a necessidade de nexo temático entre a incumbência e a competência da
instituição e o objeto do contrato. Os referidos enunciados têm o seguinte texto:
Súmula nº 250 do TCU
A contratação de instituição sem fins
lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da
Lei nº 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo
entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto
contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado.
Súmula nº 287 do TCU
É lícita a contratação de serviço de promoção
de concurso público por meio de dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso
XIII, da Lei 8.666/1993, desde que sejam observados todos os requisitos
previstos no referido dispositivo e demonstrado o nexo efetivo desse objeto com
a natureza da instituição a ser contratada, além de comprovada a
compatibilidade com os preços de mercado.
Salientamos,
ainda, que a instituição deve comprovar ter competência para exercer o objeto
do contrato por si mesma. Daí decorre a impossibilidade, ao menos em regra, de
subcontratação do objeto. No citado Acórdão nº 2669/2016 – Plenário, o Ministro
Zymler reiterou entendimento por ele já manifestado no Acórdão nº 3193/2014 – Plenário, no sentido de que a entidade a ser
contratada “deve comprovar indiscutível
capacidade para a execução do objeto pactuado por meios próprios e de acordo
com as suas finalidades institucionais, sendo
regra a inadmissibilidade de subcontratação” (grifo nosso).
A
impossibilidade de subcontratação, entretanto, não impede a contratada de, a
depender da realidade do caso, socorrer-se de serviços auxiliares de terceiros,
desde que relativos a partes não essenciais do objeto contratual, ou da
complementação do quadro de pessoal. Esse entendimento foi exposto no voto do
Ministro Zymler no Acórdão nº 3191/2014
– Plenário, ocasião em que o Ministro asseverou: “a prestação de serviços auxiliares por terceiros - referentes a partes
não relevantes do objeto - e a complementação do quadro de pessoal poderiam
ocorrer de acordo com as necessidades impostas pela contratação”.
Por
fim, realçamos o Acórdão nº 3019/2012 –
Plenário, relatado pelo Ministro José Jorge, no qual o TCU recomendou ao
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Nacionais Anísio Teixeira – INEP a
realização de rodízio entre as instituições brasileiras contratadas por
dispensa de licitação (art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/1993) para a promoção do
Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. Segundo o Relator, o rodízio “além de fomentar o mercado, afastaria os
riscos inerentes às contratações sucessivas de uma mesma prestadora de serviços”.
Entendemos que tal postura deve se aplicar a todas as situações em que a
entidade contratante necessita constantemente da contratação de instituição
brasileira por dispensa de licitação e em que o mercado contempla mais de uma
instituição brasileira sem fins lucrativos aptas para a prestar o serviço. Além
das vantagens destacadas pelo Ministro José Jorge no seu voto do Acórdão em
comento, o rodízio é consagração do princípio da impessoalidade (art. 37 da
Constituição).
Lembramos
que os requisitos acima dizem respeitos às especificidades da contratação por
dispensa de licitação com base no art. 24, XIII, da Lei nº 8.666/1993, devendo
ser somados a eles os demais requisitos comuns às contratações diretas, como a
justificativa do preço e da escolha do contratado.