L&C Comenta
O salário de referência nas contratações de serviços terceirizados e suas implicações na contratação e na execução contratual
João Luiz Domingues
É especialista em Gestão Pública e em Orçamento Público. É Auditor Federal de Finanças e Controle no Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) e Colaborador do Portal L&C.
O L&C Comenta de hoje abordará tema de grande importância nas contratações de serviços terceirizados com dedicação exclusiva de mão de obra: “A escolha do salário de referência nas contratações de serviços terceirizados e suas implicações na contratação e na execução contratual”.
Considerações Iniciais
Nos serviços com dedicação exclusiva da mão de obra, o valor do salário a ser pago ao empregado pela empresa contratada pode ser estabelecido por meio de Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho; Sentença Normativa; ou por meio de lei. Além dessas fontes, o valor do salário de referência pago ao empregado pode ser, em alguns casos, aquele praticado no mercado, ou ainda, assumir o valor do salário mínimo.
Em regra, utiliza-se o valor fixado pela Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), contudo, há hipóteses em que o valor do piso salarial é fixado para a categoria decorre de lei, como por exemplo, jornalista, engenheiro e veterinário.
Por outro lado, podemos nos deparar, em algumas oportunidades, com a falta de normativos legais ou coletivos fixando o piso salarial de determinada categoria profissional e sendo assim o valor do salário de referência pode ser aquele definido pelo próprio mercado, inclusive assumindo em alguns locais de prestação de serviços, o valor do Salário Mínimo (SM), que atualmente é de R$ 937,00 (novecentos e trinta e sete reais).
O Salário Mínimo também pode ser utilizado no caso de os valores estabelecidos pela CCT situarem-se abaixo do valor fixado pelo decreto presidencial ao final de cada ano. Tal fato ocorre quando a data base da categoria é posterior a primeiro de janeiro, data de atualização do valor do Salário Mínimo, ou sendo esta também a data base da categoria, a homologação da CCT ocorra em data posterior, o que levaria adotar o valor do salário mínimo como referência enquanto a CCT não seja homologada.
Em casos mais específicos, a Administração pode necessitar de profissionais com habilidade, competência ou experiência superior à daqueles que, no mercado, são remunerados pelo piso salarial da categoria, e por isso, desde que devidamente justificado, pode definir o valor da remuneração desses profissionais em patamar superior ao piso salarial fixado para toda a categoria.
Na maioria das vezes a Administração adota, a partir do resultado obtido na pesquisa de preços realizada junto ao mercado, um Percentual Sobre o Salário (PSS) estabelecido pela CCT. De forma exemplificativa, poderíamos listar as seguintes categorias profissionais: secretariado; apoio administrativo; tecnologia da informação; e recepcionista.
Quanto à recepcionista, a justificativa poderia residir, por exemplo, na exigência de profissional com qualificação técnica em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Braille, de modo a atender ao que preceitua a Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015, Estatuto da Pessoa com Deficiência, em seu art. 1º[1].
Cabe frisar que o empregado não poderá receber valor inferior ao estabelecido por Convenção e Acordo Coletivo de Trabalho; Sentença Normativa; ou lei, como piso salarial, e em qualquer caso valor inferior ao salário mínimo estabelecido pelo Poder Executivo Federal.
Por fim, o valor do salário de referência adotado para remunerar o empregado alocado no contrato administrativo deve ser constar da planilha de custos.
O Salário Base e a Planilha de Custos
A Instrução Normativa nº 05/2017 traz em seu Anexo VII-D o modelo de planilha de custos a ser adotado nas licitações visando à contratação de prestação de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra, podendo ser adaptado às especificidades do serviço e às necessidades do órgão ou entidade contratante, de modo a permitir a identificação de todos os custos envolvidos na execução do serviço.
A planilha de custos estabelecida pela Instrução Normativa nº 05/2017 apresenta seis módulos, sendo o Módulo 1 àquele que representa a composição da remuneração, conforme ilustrado na figura a seguir.
O salário-base ou salário de referência adotado servirá de base de cálculo para a incidência dos adicionais de periculosidade, insalubridade, noturno, hora noturna reduzida e hora extra no feriado trabalhado cujo somatório representará o total de remuneração devido ao empregado mensalmente.
O total da remuneração é base de cálculo para os Encargos Previdenciários (GPS), Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e outras contribuições, Submódulo 2.2; Provisão para Rescisão, Módulo 3; Custo de Reposição do Profissional Ausente, Módulo 4; e Custos Indiretos, Tributos e Lucro, Módulo 6.
O valor do salário de referência durante a execução contratual somente poderá ser alterado com a homologação de nova Convenção, Acordo Coletivo de Trabalho ou Sentença Normativa; pela aplicação de índice de reajuste; ou a partir da fixação de novo salário mínimo, desde que observada a anualidade dos efeitos financeiros estabelecida pela Lei nº 10.192/2001[2].
Convenção, Acordo Coletivo de Trabalho ou Sentença Normativa
Regra geral, o valor do salário de referência tem origem na CCT e a repactuação é a espécie de reajustamento do valor contratual a ser adotada, sendo a anualidade contada data do orçamento a que a proposta se referir.
Na repactuação devemos atentar para as datas base da categoria e para os efeitos financeiros proclamados pela nova CCT, que devem observar o período de doze meses. Não importa a data da realização da sessão pública ou da assinatura do contrato. A figura a seguir ilustra o caso:
No caso ilustrativo, em que pese o período entre as duas CCT’s apresentarem duração inferior a doze meses, os efeitos financeiros conferidos à categoria respeitaram a anualidade requerida pela Lei nº 10.192/2001.
Quanto ao Acordo Coletivo de Trabalho e a Sentença Normativa, a ideia central estabelecida no item anterior (CCT) permanece a mesma, ou seja, observância da anualidade em relação ao último aumento do piso da categoria. Caso não seja respeitado o período de doze meses, o aumento será internalizado via contrato administrativo por meio de revisão contratual com fulcro no art. 65, § 5º, da Lei nº 8.666/1993, e não pelo instrumento da repactuação.
Salário de Referência Fixado pelo Mercado
A situação ora apresentada não é muito comum, vez que a maioria das categorias de empregados encontram-se representados por um Sindicato, no entanto, existe a possibilidade de os locais afastados dos grandes centros encontrarmos profissionais sem representatividade sindical.
Para esses casos, o valor do salário de referência será obtido a partir da pesquisa de preços realizada junto ao mercado. O resultado encontrado pode apresentar valor acima do estabelecido para o salário mínimo ou ser o próprio salário mínimo.
Importante frisar que a depender da referência adotada como salário, o momento de reajustamento do contrato será diferente, podendo ter origem a partir da vigência de novo salário mínimo ou será contada da data sessão pública, em observância à anualidade do reajuste.
A figura a seguir exemplifica as duas hipóteses:
Hipótese 1: Valor do salário de referência obtido a partir da pesquisa de preços realizada junto ao mercado.
Neste caso, a anualidade é contada da data em que foi realizada a sessão pública - data limite para apresentação da proposta, e o contrato poderá ser reajustado a partir de 01/08/2017. O fator de correção a ser utilizado é o índice definido no edital, podendo este ser especifico, setorial ou geral, conforme o caso.
Hipótese 2: Valor do salário de referência é o salário mínimo.
Neste caso, o reajustamento do contrato terá como referência a data de alteração do valor do salário mínimo - data do orçamento a que a proposta se referir, e por isso o contrato poderá ser reajustado a partir de 01/01/2017. O fator de correção é o valor do novo salário mínimo.
Valor do Salário Mínimo Superior ao Piso Salarial
No caso de o valor do piso salarial da categoria encontrar em patamar inferior ao estabelecido para o salário mínimo, este deverá ser utilizado como salário de referência da categoria enquanto não sobrevier o novo piso da categoria por meio de sua CCT.
O instrumento para proceder à atualização do valor contratual é a revisão, também conhecida como reequilíbrio econômico-financeiro, cuja previsão legal é o art. 65, § 5º, da Lei nº 8.666/1993.
A homologação da CCT e, consequentemente, a fixação do novo piso salarial da categoria leva ao realinhamento de preços do contrato por meio da repactuação, caso o valor do salário mínimo seja inferior ao estabelecido pela CCT como piso salarial. Os valores devidos à contratada restringem-se à diferença entre os valores do contrato com o novo piso e com o salário mínimo.
Percentual Sobre a Remuneração (PSR)
Conforme descrito anteriormente, a Administração pode necessitar de profissionais com habilidade, competência ou experiência superior à daqueles que, no mercado, são remunerados pelo piso salarial da categoria, e consequentemente o valor a ser pago ao empregado será superior ao fixado como o piso da categoria. Essa regra é válida desde que seja justificada a necessidade de a Administração contar com empregados mais bem qualificados na realização das atividades diárias.
Superada essa fase, a grande dúvida que recai sobre os gestores é acerca do reajustamento do valor do contrato. A solução a ser adotada dependerá de como foi fixado o salário de referência do empregado, mas em qualquer caso estaremos tratando de repactuação e deverá ser observada a anualidade dos efeitos financeiros. Pode ser adotado o PPS ou a fixação de valor de mercado a partir da realização de pesquisa de preços. Exemplos ajudarão a elucidar o caso
1º) Adoção do PSS:
Imagine que determinada categoria apresente o piso salarial de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais) e o mercado remunera o profissional mais bem qualificado tecnicamente por R$ 3.000,00 (três mil reais), portanto, a relação MERCADO/CCT é igual a 2.
Destarte, caso a nova CCT estabeleça o piso salarial em R$ 1.800,00 (hum mil e oitocentos reais), o salário de referência do empregado alocado ao contrato assumirá o valor de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais).
2º) Adoção do valor de mercado:
A Administração pode fixar, a partir da realização de pesquisa de preços, o valor do piso salarial a ser pago ao empregado alocado no contrato. E neste caso, imagine que a Administração necessite contratar recepcionistas com qualificação técnica em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Braille, de modo a atender ao que preceitua a Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015, Estatuto da Pessoa com Deficiência em seu art. 1. A CCT em 2016 estabeleceu o piso dessa categoria em R$ 1.127,28 (hum mil reais, cento e vinte sete reais e vinte e oito centavos), enquanto o mercado retornou com o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais). A pergunta é qual será o valor do piso pago ao empregado a partir da homologação de nova CCT?
A resposta é simples: basta adotar sobre o valor do piso pago – R$ 2.000,00, o percentual de correção do piso salarial pela CCT. Importante estabelecer esta regra no instrumento convocatório e anexos. No caso concreto, em 2017 a CCT estabeleceu o piso de R$ 1.201,34 (hum mil, duzentos e um reais e trinta e quatro centavos), o que representa um aumento de aproximadamente 6,6% em relação ao piso de 2016, o que elevaria o valor do salário de referência para R$ 2.132,00.
Os demais itens ou insumos da CCT são tratados conforme de costume, como por exemplo, auxílio alimentação, auxílio creche e assistência odontológica.
[1] Art. 1º É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.
[2] Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.
§ 1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.
Art. 3º.
§ 1º A periodicidade anual nos contratos de que trata o caput deste artigo será contada a partir da data limite para apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir.