L&C Comenta
Os Impactos da Lei Nº 14.973/2024 na elaboração do Orçamento Estimativo para Serviços Prestados com Dedicação Exclusiva de Mão de Obra

João Luiz Domingues
É especialista em Gestão Pública e em Orçamento Público. É Auditor Federal de Finanças e Controle no Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) e Colaborador do Portal L&C.
A
adesão ao benefício fiscal da desoneração da folha de pagamento pelas empresas
terceirizadas deve observar ao regramento disposto pela Lei nº 12.546, de 14 de
dezembro de 2011, cujo impacto se revelava tão somente nas propostas comerciais
apresentadas pelas empresas participantes dos certames realizados pelos órgãos
e entidades integrantes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Entretanto,
desde 1º de janeiro de 2025, com a vigência da Lei nº 14.976, de 16 de setembro
de 2024, a desoneração da folha de pagamento passou a repercutir igualmente na
elaboração do orçamento estimativo para serviços terceirizados com dedicação
exclusiva de mão de obra[1],
haja vista a iniciação do regime de transição para a contribuição substitutiva
prevista nos arts. 7º e 8º da Lei nº 12.546/2011, em que a alíquota referente
ao INSS apresentar-se-á de forma progressiva até 2027, oportunidade que
atingirá o percentual de 20,00%. Portanto, essa mudança precisa ser refletida
na estrutura da planilha de custos.
Importante
destacar que a alíquota do INSS prevista na nova legislação não incidirá sobre
as remunerações pagas, devidas ou creditadas a título de décimo terceiro
salário, conforme determina o §1º do artigo 9-A da norma.
Apesar
dessa previsão legal, uma análise realizada em 12 editais de licitação para
serviços terceirizados na área de apoio administrativo, publicados entre 1º de
janeiro e 23 de fevereiro de 2025 no Portal de Compras do Governo Federal, indicou que a metodologia de
cálculo utilizada pelos órgãos e entidades dos Três Poderes não estava alinhada
às disposições da Lei nº 14.973/2024.
A
principal razão para essa inconformidade se deve à elaboração dos orçamentos
ainda em 2024, sem levar em conta os impactos da oneração progressiva no
exercício de 2025. Além disso, há indícios de inércia por parte dos órgãos
superiores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário na orientação
tempestiva às suas unidades subordinadas sobre as consequências da Lei nº
14.973/2024 na formulação do orçamento estimativo para serviços terceirizados
com dedicação exclusiva de mão de obra.
Diante
desse cenário, o presente estudo busca divulgar as medidas necessárias para que
os órgãos e entidades da Administração Pública Federal, Estadual, Municipal e
Distrital elaborem corretamente seus orçamentos estimativos para a contratação
de serviços terceirizados com dedicação exclusiva de mão de obra, além de
sugerir ajustes nas planilhas de custos dos contratos vigentes para garantir a
conformidade com a nova legislação.
Metodologia de Cálculo
até 31/12/2024
O
benefício fiscal da desoneração da folha de pagamento, antes da vigência da Lei
nº 14.973/2024, não exigia dos órgãos e entidades públicas maior cautela na
elaboração do orçamento estimativo para serviços terceirizados com dedicação
exclusiva de mão de obra. Isso se dava porque as empresas optantes pelo
referido benefício apresentavam, em suas propostas comerciais, percentuais de
0,00% para o INSS no Submódulo 2.2 e de 1,50% a 4,50% para a Contribuição
Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) no Módulo 6.
Considerando
esse cenário, a metodologia de cálculo a ser adotada na elaboração do orçamento
estimativo depende da estrutura da planilha de custos, especialmente no
Submódulo 2.1 – Décimo Terceiro, Férias e Adicional de Férias, que pode
apresentar diferentes configurações.
Dessa
forma, ao seguir a estrutura definida pela Instrução Normativa Seges nº
05/2017, a metodologia de cálculo deve observar os seguintes parâmetros:
Submódulo 2.1 – Décimo
Terceiro, Férias e Adicional de Férias |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
Décimo Terceiro Salário |
8,33% |
R$ |
B |
Férias e Adicional de
Férias |
12,10% |
R$ |
Total |
20,43% |
R$ |
Base de Cálculo: Módulo 1 – Remuneração
= 8,33% X Módulo 1
= 12,10% X Módulo 1
Submódulo 2.2 – Encargos
Previdenciários, FGTS e outras Contribuições |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
INSS |
20,00% |
R$ |
B |
Salário Educação |
2,50% |
R$ |
C |
Risco Ambiental de Trabalho |
3,00% |
R$ |
D |
SESI/SESC |
1,50% |
R$ |
E |
SENAI/SENAC |
1,00% |
R$ |
F |
SEBRAE |
0,60% |
R$ |
G |
INCRA |
0,20% |
R$ |
H |
FGTS |
8,00% |
R$ |
Total |
36,80% |
R$ |
Base de Cálculo: Módulo 1 + Submódulo 2.1
= 20,00% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 2,50% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 3,00% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 1,50% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 1,00% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 0,60% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
= 0,20% X (Módulo 1 + Submódulo 2.1)
Metodologia de Cálculo a
partir de 01/01/2025
Com
a vigência do regime de transição para a contribuição substitutiva prevista nos
arts. 7º e 8º da Lei nº 12.546/2011, a partir de 1º de janeiro de 2025 torna-se
necessária a adaptação da planilha de custos à oneração gradativa da folha de
pagamento estabelecida pela Lei nº 14.973/2024. Essa adequação inclui a
incorporação da linha INSS – Empresa Desonerada no Submódulo 2.2 e a
respectiva exclusão da incidência sobre o décimo terceiro salário.
Essa
medida deve ser observada tanto na elaboração do orçamento estimativo quanto na
concessão do equilíbrio econômico-financeiro em processos de revisão
contratual. A seguir, destaca-se o trecho extraído da Lei nº 14.973/2024 que
fundamenta essa adequação.
Art. 9º-A. Nos exercícios
de 2025 a 2027, as empresas referidas nos arts. 7º e 8º desta Lei
poderão contribuir sobre o valor da receita bruta, excluídos as vendas
canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição parcial às
contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº
8.212, de 24 de julho de 1991, sendo tributadas de acordo com as seguintes
proporções:
I – de 1º de
janeiro até 31 de dezembro de 2025:
a) 80% (oitenta por cento)
das alíquotas estabelecidas nos arts. 7º-A e 8º-A desta Lei; e
b) 25% (vinte e cinco por
cento) das alíquotas previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei
nº 8.212, de 24 de julho de 1991;
II – de 1º de
janeiro até 31 de dezembro de 2026:
a) 60% (sessenta por
cento) das alíquotas previstas nos arts. 7º-A e 8º-A desta Lei; e
b) 50% (cinquenta por
cento) das alíquotas previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei
nº 8.212, de 24 de julho de 1991; e
III – de 1º de
janeiro até 31 de dezembro de 2027:
a) na proporção de 40%
(quarenta por cento) das alíquotas previstas nos arts. 7º-A e 8º-A desta Lei; e
b) 75% (setenta e cinco
por cento) das alíquotas previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da
Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
§1º A partir de 1º de
janeiro de 2025 até 31 de dezembro de 2027, para fins de cálculo do valor
devido sob o regime da substituição parcial de que trata o caput deste artigo,
as contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212,
de 24 de julho de 1991, não incidirão sobre as remunerações pagas,
devidas ou creditadas a título de décimo terceiro salário. (Grifos nossos)
Por
conseguinte, de forma simplificada, a planilha de custos deve observar a
seguinte estrutura e metodologia de cálculo quando da elaboração do orçamento
estimativo com base nos impactos da Lei nº 14.973/2024:
Submódulo 2.1 – Décimo
Terceiro, Férias e Adicional de Férias |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
Décimo
Terceiro Salário |
8,33% |
R$ |
B |
Férias e Adicional de Férias |
12,10% |
R$ |
Total |
20,44% |
R$ |
A
metodologia de cálculo do Submódulo 2.1 não se altera em relação à utilizada anteriormente
para a condição anterior a 01/01/2025.
Submódulo 2.2 – Encargos
Previdenciários, FGTS e outras Contribuições |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
INSS |
20,00% |
R$ |
A.1 |
INSS – Empresa Desonerada |
0,00% |
R$ |
B |
Salário Educação |
2,50% |
R$ |
C |
Risco Ambiental de
Trabalho |
3,00% |
R$ |
D |
SESI/SESC |
1,50% |
R$ |
E |
SENAI/SENAC |
1,00% |
R$ |
F |
SEBRAE |
0,60% |
R$ |
G |
INCRA |
0,20% |
R$ |
H |
FGTS |
8,00% |
R$ |
Total |
36,80% |
R$ |
A
única alteração na estrutura da planilha de custos reside na inclusão da Linha
A.1, INSS – Empresa Desonerada, cuja base de cálculo é o somatório do
Módulo 1, Férias e Adicional de férias[2].
Por
conseguinte, conclui-se que a elaboração do orçamento estimativo altera somente
a estrutura do Submódulo 2.2 e a metodologia de cálculo do INSS – Empresa
Desonerada, em virtude da hipótese de a empresa ser optante pela
desoneração da folha de pagamento, mas sem que tal fato altere o valor estimado
final, ou seja, superestimando-o.
A
empresa que for optante pelo benefício fiscal da desoneração da folha de
pagamento deve formular proposta incluindo 5,00% na Linha A.1, INSS –
Empresa Desonerada, e zerar a Linha A, INSS, assim como indicar a título de
CPRB o percentual de 3,60% no Módulo 6.
Estrutura da planilha de
custos no caso de revisão contratual
A
revisão contratual não traz maiores dificuldades ao gestor/fiscal de contratos,
bastando inserir 5,00% no INSS, Submódulo 2.2, e 3,60% no Módulo 6, para o
período referente a 01/01 a 31/12/2025.
Contudo,
não se pode olvidar que a base de cálculo do INSS deve observar o somatório
entre o Módulo 1, Férias e Adicional de férias, e apresentar a seguinte
estrutura.
Submódulo 2.2 – Encargos
Previdenciários, FGTS e outras Contribuições |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
INSS |
5,00% |
R$ |
B |
Salário Educação |
2,50% |
R$ |
C |
Risco Ambiental de Trabalho |
3,00% |
R$ |
D |
SESI/SESC |
1,50% |
R$ |
E |
SENAI/SENAC |
1,00% |
R$ |
F |
SEBRAE |
0,60% |
R$ |
G |
INCRA |
0,20% |
R$ |
H |
FGTS |
8,00% |
R$ |
Total |
21,80% |
R$ |
Módulo 6 - Custos Indiretos,
Tributos e Lucro |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
Custos
Indiretos |
% |
R$ |
B |
Lucro |
% |
R$ |
C |
Tributos |
% |
R$ |
C.1 |
PIS |
% |
R$ |
C.2 |
Cofins |
% |
R$ |
C.3 |
CPRB |
3,60% |
R$ |
C.4 |
ISS |
% |
R$ |
Total |
% |
R$ |
Entretanto,
não se mostra incomum identificar planilhas de custos em contratos vigentes em
2025 em que o Submódulo 2.1 apresenta a incidência do Submódulo 2.2. em sua
estrutura, conforme se verifica a seguir.
Submódulo 2.1 – Décimo
Terceiro, Férias e Adicional de Férias |
|||
|
Itens |
Porcentagem (%) |
Valor (R$) |
A |
Décimo
Terceiro Salário |
8,33% |
R$ |
B |
Férias e Adicional de Férias |
12,10% |
R$ |
Subtotal |
20,43% |
R$ |
|
C |
Incidência do Submódulo 2.2 |
7,52% |
R$ |
Total |
27,95% |
R$ |
Nesta
hipótese, o ajuste mais eficiente para a gestão contratual seria a substituição
desse formato pela estrutura prevista na Instrução Normativa Seges nº 05/2017,
cuja base de cálculo do Submódulo 2.2, à exceção do INSS, deve observar o
somatório do Módulo 1 e Submódulo 2.1, enquanto a contribuição previdenciária
de 5,00% deverá incidir tão somente sobre o somatório do Módulo 1, Férias e
Adicional de Férias.
Além
disso, não é incomum que o Submódulo 2.1 não inclua o item Férias em sua
estrutura, sendo este deslocado para o Submódulo 4.1. Essa particularidade não
invalida a adequação descrita no parágrafo anterior, exceto pela alteração da
base de cálculo do Submódulo 2.2, que, nesse caso, deve considerar apenas os
valores do Módulo 1 e do Adicional de Férias.
Adicionalmente,
observa-se a presença do percentual de 1,62% no Submódulo 4.1, correspondente à
parcela referente a Férias, Adicional de Férias e Décimo Terceiro do empregado
substituto. Nesse contexto, é essencial que a base de cálculo sobre a qual esse
percentual incide seja corretamente composta, excluindo-se, se necessário[3],
a parcela referente à contribuição previdenciária sobre a parcela do décimo
terceiro salário.
A
não observância das orientações aqui registradas pode impactar a execução
contratual caso a empresa vencedora do certame opte pelo benefício fiscal da
desoneração da folha de pagamento.
A
administração ao identificar o equívoco na metodologia de cálculo buscará
recuperar “os valores pagos indevidamente” à empresa contratada, valendo-se,
para tanto, do instrumento de glosa contratual. No entanto, essa medida inicial
pode não ser adequada, uma vez que o critério de julgamento adotado no certame
foi o menor preço, e a proposta da empresa vencedora foi homologada observando
esses parâmetros.
Por
fim, cabe ressaltar que o valor global da proposta permaneceria inalterado,
ainda que o pregoeiro solicitasse a correção da metodologia de cálculo para
adequação ao INSS – Empresa Desonerada, visto que o critério de
julgamento se baseia no menor preço.
Caso prático
Dentre
a amostra analisada, a título de exemplo, foi selecionada a licitação realizada
pela UASG 150002, PE 90003/2025, na qual o valor estimado do posto de
Assistente Administrativo II alcançou R$ 9.617,52. Esse valor permanece
inalterado na readequação do orçamento estimativo à oneração progressiva da
contribuição previdenciária, uma vez que esse item se mantém zerado nesta fase
da contratação.
No
entanto, o montante alocado para o INSS – Empresa Desonerada sofre uma
redução aproximada de 7,00%, caso a empresa apresente proposta comercial na
condição de optante pelo benefício fiscal da desoneração da folha de pagamento.
Essa redução ocorre se a planilha de custos estiver ajustada às disposições da
Lei nº 14.973/2024, que determina a exclusão das remunerações pagas, devidas ou
creditadas a título de décimo terceiro salário da base de cálculo da
contribuição previdenciária.
Conclusão
Pelo
exposto, conclui-se que os órgãos e entidades, ao elaborarem o orçamento
estimativo para a contratação de empresas prestadoras de serviços com dedicação
exclusiva de mão de obra, devem ajustar a estrutura do Submódulo 2.2 – Encargos
Previdenciários, FGTS e outras Contribuições, e, se for o caso, do Submódulo
4.1. Esse ajuste visa incluir a hipótese de oneração progressiva da
contribuição previdenciária prevista na Lei nº 14.973/2024 – INSS - Empresa
Desonerada, a fim de evitar desconformidades durante a execução contratual.
A
adaptação da estrutura dos Submódulos 2.2 e 4.1 independe de orientações dos
órgãos superiores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, uma vez que
cada órgão e entidade possui autonomia para definir a metodologia de cálculo a
ser adotada na elaboração do orçamento estimativo para a contratação de
serviços prestados com dedicação exclusiva de mão de obra.
No
que se refere à revisão contratual em razão do início da vigência da Lei nº
14.973/2024, o ajuste da planilha de custos dependerá da estrutura e da
metodologia de cálculo estabelecidas na planilha homologada no certame.
Contudo, permanece a orientação de que o percentual de INSS, fixado em 5,00%,
não poderá incidir sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas a título
de décimo terceiro salário.
Por
fim, ainda que os valores envolvidos possam apresentar baixa materialidade, a
criticidade desse aspecto não pode ser desconsiderada pelos órgãos e entidades,
tanto na fase de elaboração do orçamento estimativo para a contratação de
serviços terceirizados com dedicação exclusiva de mão de obra, quanto na
análise de eventuais pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Isso se justifica pelo fato de que as intercorrências decorrentes dessa
sistemática se materializarão ao longo da execução contratual, devendo,
nestes casos, serem encaminhadas ao órgão de assessoramento jurídico para
análise e manifestação quanto à conformidade dos aspectos legais.
[1] A repercussão se revela tão somente em
relação à estrutura e à metodologia de cálculo e não em termos de valor
estimado da contratação.
[2] O valor referente ao décimo terceiro
salário não pode compor a base de cálculo do INSS.
[3] Têm-se observado diversas planilhas de
custos homologadas em certames sem que haja a incidência do Submódulo 2.2 sobre
as parcelas de décimo terceiro salário, férias, adicional de férias, o que se
mostra equivocado sob o ponto de vista adequabilidade da formação do preço,
contudo, nesta condição não se precisa fazer qualquer ajuste da incidência da
contribuição previdenciária, tendo em vista a sua falta de
ocorrência.